A lareira acesa...
A noite que cairia e eu ali sentado, no mesmo sitio de sempre, por entre, o infinito vazio.
Esse vazio que respira e se faz sentir, nesta casa outrora repleta de gritos e movimentos, de calor humano e alegria.
Ainda aqui estou...
Só.
A velha manta ao meu colo, repleta de buracos de cinza ardida, destes cigarros que continuam a ser o laço que me une a esse passado.
O copo de Whisky a meu lado...
A luz do candeeiro, o rádio ligado enquanto as mãos me tremem, tremendo cada vez mais.
Como passou tão depressa...
Como passou?
Oiço as mesmas canções, melodias que significaram tanto, tamanho querer que desvaneceu.
Os meus olhos cansados já não conseguem discernir as letras do jornal sem a ajuda de uma lupa, para me manter informado das novas que o mundo tem para contar, esse mundo que tanto mudou, se transformou, radicalmente se transmutou.
Faltam-me as forças, aquelas que antigamente me sobravam, num entrelaçado enigma em que se pincelou a minha vida.
Foram ficando para trás todos os momentos, rostos e pensamentos, até sobrar este nada que tanto significa, tanto abrange, tanto me sufoca.
É a ele, este nada, que me agarro com todas as forças para viver, num desconexo, incompreensível e inexplicável querer.
O meu coração já não pulsa, somente soluça, aqui e acolá enganado por uma ou outra pastilha receitada pelo Senhor Doutor...
Doutor?
Agora são todos “Doutores”...
Desde a empregada doméstica até ao moço dos jornais.
Não percebo nada deste mundo...
Aqui estou rodeado de retratos e rostos, feridas abertas em meu peito, dores e aflições que chegam e partem silenciosamente.
Já vos perdi, sem nunca me ter apercebido de vos ter tido...
Era tudo tão corrido, mesmo os jantares, mesas repletas, nessa azáfama que desassombradamente me escapou.
A lareira acesa...
Tenho tanto frio, tanto sono, tanto medo.
Já não sei escrever nem decorar o saber, perdido que me encontro neste labirinto de emoções que me persegue.
Para onde foram os amigos?
Os filhos?
E tu meu amor...
Para onde foste?
Todos partiram para esse lugar incerto, tantas vezes explanado na fé, essa que me foi abandonando à medida que só me encontrava, nesse desabitado coração meu...
Estou solitariamente entregue a este refúgio, nesta sala, neste museu de relíquias minhas, empoeiradas e amordaçadamente sombrias.
Estou só...
À espera de partir, de finalmente sentir esse encontro prometido na infinita sabedoria de Deus.
Deus?
Só espero que também Tu, não me tenhas abandonado...
Deus Meu.
Filipe Vaz Correia