19.12.17
Não sou mais capaz de caminhar...
Estou cansado deste suplicio amargurado, caminho de espinhos com que soletro esta parte de mim silenciosa, esta parte de nós muda, pouco mudando do lado de fora deste mundo cinzento que insiste em me esmagar.
Já não correm as crianças na rua, já não existe ruído, nem rua...
As casas vazias, tão vazias que consigo ouvir o silêncio ruidoso, a solidão imensa, a imensidão descompassada que tomou conta de cada viela desta minha aldeia.
Já morreram os que anteriormente viveram, já sobraram poucos daqueles que antigamente sorriram.
A espera por tudo e por nada...
Esperando sem saber, por cada rosto que já não volta, por cada lágrima que não pára de correr, por cada pedaço desta memória que ainda em mim habita.
O espelho ali permanece, recordando-me cada ruga, cada cabelo branco, cada dor amargurada, de um futuro inquieto, cada pedaço desse passado que já não reconheço naquela imagem.
E o silencio...
Essa companhia maldita, que faz parte desse presente angustiado, solitariamente desencontrado.
Já não chove, já não faz sol...
Apenas sinto esse distante contraste, do que fui, do que fomos, do que marcadamente temo esquecer.
As chaminés sem fumo, as portas cerradas, as janelas fechadas, escombros desta aldeia cheia de alma, resquícios de vidas e vidas, desaparecidas.
Aqui me encontro...
Sozinho, sempre sozinho.
A lareira acesa, o papel e caneta, o café bem quente e o vazio...
Esse vazio que persegue esta velha parte de mim, esse silêncio que se apodera de tudo.
Da minha aldeia...
A minha solitária aldeia.
Filipe Vaz Correia