14.12.17
O que estará por trás, do olhar de um Sem-Abrigo?
Daquele Sem-Abrigo?
Quantas dores permanecem encobertas, por aquele ar austeramente abandonado, enlameadamente escurecido, quase ofensivamente perturbador desta vida "normal", das pessoas "normais"...
Barba toda branca, amarelada, cabelos igualmente brancos, encardidos, com a sujidade presente na pele, nas unhas, na roupa.
Tudo me perturba...
Tudo deveria perturbar.
Caminha só, acompanhado pelas palavras que insiste em debitar alto, prometendo continuar sussurrando o malfadado destino que parece se ter cumprido, amarrado à infelicidade presente, na ausente vontade de ser "normal...
Gente comum.
A tristeza e a revolta parecem ter ali espaço, só ter ali espaço, naquele homem, naquele insistente olhar, que por mais que me esforce custo a esquecer.
Um olhar vazio, apesar de ser negro, presente apesar de nada nele existir, tem vida, reflectindo o nada, sempre o nada, que ganha expressão naquele rosto.
Esse vazio assustador, mistura de dor, de mágoa, de um abismo transformado em vida.
Aquele homem, aquela vida, ou o que dela resta, caminha só...
Continua percorrendo a rua, as ruas e os meus olhos acompanham-no, vão acompanhando os seus passos, até desaparecer no horizonte e se tornar para mim, o que antes havia sido...
Nada!
Mas no fundo da minha alma, no recanto do meu coração, aquela imagem permanece, aquela solidão que parecia ser sua companhia, arrepiou esta parte de mim que aqui desabafa...
Querendo vos escrever.
Quem terá feito parte daquela vida?
Como se perderam os desamores e amores daquele homem?
Como ficou vazia uma vida?
Abandonado no meio de tanto mundo, de tanta gente, de todos nós.
Perguntas que esvoaçam por entre as linhas e letras deste post, ficando sem as respostas, que porventura acompanham aquele homem, descendo a rua, prosseguindo o seu destino...
Aquele destino, que há muito, o abandonou.
Filipe Vaz Correia